Há já alguns anos que nutria um desejo de estar numa festa do Avante, talvez por tudo o que ouvia da parte de amigos, talvez porque esperava encontrar um espaço onde os ideais do comunismo vivessem fortes num ambiente de alegria e camaradagem, ainda mais com uma companhia que torna qualquer viagem algo inesquecivel. É com uma certa desilusão que acabemos por assistir a mais um festival de verão dos muitos que se realizam todos os anos...
No caminho tudo bem, camionetas de graça até perto do recinto, um afabilidade dos membros da comissão de festas que não encontro a não ser em concertos de "amigos", à chegada defrontamo-nos com uma verdadeira invasão em massa, com pessoas e tendas espalhadas por tudo quanto é relvado, descampado e passeio, o que puderia ser uma demostração da vitalidade actual do PC. O primeiro problema foi chegar junto do acampamento e munidos dos nossos ep's (entradas permanentes, compradas num núcleo do partido) somos informados que o acampamento se encontra cheio. Algo incompreensivel visto que por comprarmos as entradas com antecedencia seria de esperar que tivessemos um lugar garantido nas contas da organização (ao menos deveriamos ter prioridade em relação aos que se apresentaram à última da hora sem EP). Fomos direcionados ao "acampamento alternativo", alternativo na medida em que nem era organizado, nem vigiado, nem ficava perto de nenhuma das entradas das festa, nem tão pouco era um acampamento mas sim um pequeno número de tendas num pequeno pinheiral na margem da baia do seixal.
Com alguma hesitação acabámos por montar tenda por nossa conta e risco, arriscando-nos a voltar nessa noite para descobrir que haviamos tido visitas menos agradáveis aos aposentos momentâneos. Todo o atraso provocado pela situação levou a que perdessemos dois dos concertos que tinhamos planeado ver (Luso Tango e Primitive Reason), mas ainda assim lá acabamos por marchar até à entrada mais próxima para aproveitar o que ainda restava para ver.
A primeira impressão logo que entramos no recinto é de uma desilusão imediata! Stand da cabovisão?! Barracas de quinquilharia, berbicacharia e memorabilia tipo feira da ladra condensada em 100 metros! Saias, fios, aneis, xailes, chapeus mexicanos, t-shirts da "erva", com slogans pseudo-comunistas, com o Che (ok, estas até se admitiam), djambés, "artesanato" africano, inclusive até conhecidos nossos da feira da ladra genuina (pronto eles até moram ali perto, por isso não foi grande admiração). Mas o que é isto?! Comunismo consumista? Mas não era um ponto isolado, as tão famosas barracas de comida regional era também uma exploração ao mais alto nivel! 3 euros um caldo verde? 10 euros uma dose microscopica de choco frito com batatas?! 23 euros um kg de leitão?! Mas isto é que é um festival popular? Com preços a rivalizar um festival capitalista? Tudo bem que o dinheiro é para finaciamento do partido mas não é preciso sugar até ao tutano, como acusam os senhores da direita de fazer...
Os festivaleiros, gente do povo em excursões familiares como esperado, punks, rastas, hippies, skins, betos, pseudos de todos os estilos e vitimas de uma ou mais modas em conjunto. Mas isto não era uma festa comunista? Pessoal com ténis da nike e t-shirts a dizer communist inside? Bebados e ganzados é o normal, mas bebermos ou fumarmos uma não nos torna comunistas instantâneos! Tudo a cantar o avante camaradas quando nem sabem a que propósito foi a música criada, a dançarem ao som do grandola vila morena que "é um som dakele gajo muita fixe que agora não me lembro que era da altura do Salazar que axu k era um ditador muita bera". Onde ficaram os ideais?! Custa-me a acredita que é isto o avante...
É claro que nem tudo era mau, o espaço internacional era mais uma zona comercial, mas sempre havia a festa do livro (não muito diferente da feira de Lisboa no entanto), a bienal de arte com artistas bastante interessantes e algumas obras bastante surpreendentes (não era o caso do quadro maravilha do Álvaro Cunhal, que não mostrava nada de novo, apenas a mudança de técnica não justifica o alarido todo). E o ponto mais alto foi o palco dos novos valores com excelentes actuações dos Skareta e da banda Hc de Beja, Undercut (uma surpresa agradável), pena terem sido remetidos a actuar ao lado e em simultâneo com uns xutos gastos no palco 25 de Abril cheio de gente. Diminuindo assim as chances de se mostrar o que realmente é musica nova e com qualidade a muitas almas por cativar.
No dia seguinte esperávamos que a coisa melhorasse, mas tornou-se quase impossivel tentar almoçar com as filas e os preços exagerados. Tentar ver os Terrakota com akele sol de 3 da tarde num palco ao ar livre e com tanta gente também se provou bastante desagradável, por isso fomos logo para o pavilhão primeiro de Maio, onde encontarmos um ambiente descontraido, onde podiamos estar sentados no chão a ouvir canções do algarve enquanto esperávamos os Dazkarieh. Não queriamos mais nada, assim que os Terrakota pararam e apesar do já cheio pavilhão (com gente sentada) pequenos grupos de verdadeiros "camaradas do egoismo", que empurrando, furando e não respeitando quem estava sossegado da vida se colocam de pé, e começam a dançar e a levantar pó nas caras dakeles que estavam até ali descontraidos a apreciar o espétaculo, obrigados então a levantarem-se e num ambiente já de estufa, ainda temos mais gente a entrar, meninos a fumar para aqueles que não fumam terem uma experiência de concerto ainda mais agradável...
Obrigados a não assistir ao concerto porque nada vale estar num mau ambiente, sem ver nada e perspectivando que a noite com Blasted provasse ser ainda mais desagradável, acabámos por decidir evacuar o local enquanto a paciência não se esgotasse. Nunca na minha história de concertos fanhosos em casas a cair, com punk bebados e a dar no cavalo (exageeeeerooo), com moshes fenomenais e faltas de ar condicionado encontrei um ambiente tão podre e decadente...
De volta a Lisboa, desiludidos e tristes pela morte de um "sonho" que pensavamos estar próximo dos poderes de um partido comunista portugês tão grande 30 anos atrás e tão prostituido pelos membros que desonram a memória daqueles que lutaram anos contra a ditadura e a favor do socialismo. "Recuem camaradas, recuem..."
PS: O obrigado aos verdadeiros camaradas que nos deram a mão nos dois dias, são vocês o verdadeiro partido.
PS2: Vá lá sempre comprei o Até Amanhã Camaradas, que é um grande livro que realmente mostra o que era ser comunista!