Na passada quinta-feira estive no lançamento do livro
Comer Animais de
Jonathan Safran Foer, apresentado pelo
Heitor Lourenço (não fazia ideia de que este é vegetariano) no restaurante
Jardim dos Sentidos (que tenho de visitar um dia destes pois gostei bastante do catering), em representação do
Centro Vegetariano.
Como seria de esperar, quem lá apareceu estava na sua maioria ligado à causa vegetariana/animal. Notei a presença da
Associação Vegetariana Portuguesa, a
Animal e o
Partido da Natureza e dos Animais, apesar de no fundo o livro acabar por ser mais direccionado para os não-vegetarianos.
Safran conta num tom pessoal as suas experiências de aderência/desistência do vegetarianismo, investigando as origens dos hábitos alimentares modernos e dos muitos mitos sobre a alimentação, passando pela realidade pouco divulgada da indústria de produção de carne. A ideia do livro não é converter ninguém ao vegetarianismo, mas sim, informar e sensibilizar quem o lê sobre a realidade por trás de algumas escolhas alimentares, de forma a que as possam tomar, com plena consciência daquilo que elas custam eticamente e da sustentabilidade (ou insustentabilidade) das mesmas.
Talvez na boleia deste lançamento, a
Visão desta semana trazia um artigo sobre crianças vegetarianas, que apesar de positivo, revela os preconceitos desinformados do costume, acerca de carências alimentares e a repetição do adjectivo do costume, o fundamentalismo.
Sobre as carências, fala-se em
Omega 3 e
Vitamina B12. A primeira é uma falácia mesmo num regime
vegan (completa ausência de produtos animais ou derivados), pois há vários frutos secos (em especial as nozes) altamente ricos no composto, que está ligado à redução do stress e ansiedade (recomenda-se suplementos desta para combater hipertensão, por exemplo).
Quanto à segunda, a questão é um pouco mais complicada, existindo muita desinformação ao redor da mesma. O que importa saber é que na realidade a
Vitamina B12 não se ingere, esta é produzida por uma estirpe de bactérias
E. Coli, que se alojam no intestino e a segregam como subproduto do seu metabolismo normal. Estas bactérias existem quer em animais, quer em plantas, o problema é que o uso excessivo de pesticidas e químicos na agricultura moderna acaba por eliminar as mesmas. Mais, as mesmas subsistem no organismo décadas após a sua ingestão, sendo que é durante o período de amamentação que a mãe transmite as bactérias ao seu bebé através do leite, dai que para um ovo-lacto vegetariano, exactamente por consumir lacticínios, esta não seja sequer uma preocupação.
Já para alguém com uma dieta
vegan, o suplemento é essencial mas necessário muito menos vezes que poderão pensar (neste caso convém mesmo fazer testes de vez em quando para controlar). Eventualmente poderão, como alternativa, consumir
Kefir alimentado com água (este é é basicamente uma bactéria/fungo que também produz B12 e tem outros benefícios para a flora intestinal)...
Daí que dizer que se deve comer carne para suprir a B12 seja cair numa falácia, pois a presença de
E. Coli na carne industrial que se consome também não é propriamente normal e deve-se à contaminação da mesma durante o desmanche (literalmente os excrementos que caem sobre a peça de carne, quando no abate se fura o intestino sem querer).
Já sobre o fundamentalismo dos vegetarianos, convém lembrar que além do significado religioso, o termo "
(..) passou a ser usado por outras ciências para significar uma crença irracional e exagerada, uma posição dogmática, ou até um certo fanatismo em relação a determinadas opiniões (...)". Ora nada está mais longe da atitude e forma de estar da grande maioria dos vegetarianos ou
vegans (há excepções claro), que na sua opção questionaram primeiro o dogma do omnivorismo, e posteriormente pesquisaram e pensaram muito sobre tudo o que essa escolha implicava (normalmente quem desiste é por falta de informação ou de sustentação ética na escolha).
Escolher ser vegetariano é tudo menos irracional e fanático, aliás fundamentalistas serão mais rapidamente os pejorantes, que questionam a escolha individual dos outros sem nunca terem sequer questionado os seus próprios hábitos alimentares e sem qualquer argumentação lógica para censurarem a dieta alheia.
Prova disso é que quase ninguém com uma dieta dita normal, se queixa que ao almoçar com um vegetariano lhe são feitas mil perguntas, mil "avisos" ou até comentários desdenhosos, mesmo havendo razões cientificamente comprovadas para questionar o consumo excessivo de carne (cancros, colesterol, etc...) e argumentos éticos relacionados com o sofrimento e morte de seres sentientes... mas é quase impossível que um vegetariano almoce com um não vegetariano (pior ainda, com um grupo!) sem que isso aconteça...
Quem são afinal os fundamentalistas?
Podem encontrar o livro no link abaixo... garanto-vos que é bem mais interessante que a minha retórica sobre o assunto ;)
http://www.bookhouse.pt/catalogo/literatura-autores-estrangeiros_0880/comer-animais_9789722522373.aspx