privacidade

Ontem, durante 5 horas de espera numa conservatória do registo civil para tirar o cartão do cidadão, pude ter várias conversas com pessoas que não conhecia de lado nenhum e que provavelmente não tornarei a ver tão cedo, ou já não serei capaz de reconhecer quando se der o acaso de novo cruzamento.

No meio das conversas que fugiram o mais possível da típica "conversa de ocasião" (odeio falar só para encher chouriços), entrou-se no tema dos impostos e das contribuições para o estado. Sobre esse tema a minha opinião é simples e pragmática, em vez de impostos complicados e com buracos por onde se foge à vontade, o sigilo bancário devia ser completamente abolido e o estado passaria a cobrar 40% (acho o máximo do razoável) de todos os nossos rendimentos. Preenchimento de papéis seria apenas para descontarmos despesas tributáveis a esse valor.

É claro, que a resistência quase unânime, quando exponho esta ideia, é a privacidade. E o exemplo "chapa 0" é sempre o mesmo... se "eu" quiser comprar um colar à minha amante, o estado (e a mulher consequentemente visto que não percebem que entre o estado ter acesso e esse acesso ser público vai uma longa distância) tem que ficar a saber?

Tido isto, a principal função daquilo que as pessoas designam por privacidade parece ser encobrir a pequena, média e grande aldrabice. Porque é que as pessoas sendo honestas e eticamente verticais haveriam de ter medo que o estado ou mesmo qualquer outro cidadão, tivesse conhecimento do que fazemos, de quanto dinheiro ganhamos, quanto gastamos e onde?

Para mim privacidade é aquilo que fazemos dentro das nossas casas e nos nossos espaços privados, tudo o resto é da esfera pública. Deixando de lado paranóias orwellianas, se sou um cidadão honesto e não devo nada a ninguém qual é o meu problema que saibam da minha vida? Mais, se uma coisa tão banal e mundana como o meu dia-a-dia interessa a alguém, tenho muita pena dessa pessoa pois a sua vida é tão triste e desprovida de sentido que toma interesse em algo completamente desprovido do mesmo.

Pergunto-me e deixo a pergunta, será que preferimos ter uma suposta "privacidade" ou viver numa sociedade justa em que todos dão e recebem aquilo que devem dar e receber?

3 comentários:

  1. Então, eu recebo o ordenado e pago 40% ao estado. A seguir, transfiro ao meu primo que está desempregado uma outra parte do meu ordenado, e ele paga dessa parte que lhe dou 40% ao estado, porque o estado vai ver a conta dele e contabiliza isso como um rendimento?
    Em relação à privacidade, realmente acessível ao estado não significa público, mas quem trabalha no estado é o público. Agora imagina que a minha cunhada trabalha nas finanças e tem acesso aos dados da compra do colar, o que achas que ela vai fazer?
    Infelizmente quem faz as leis e quem representa a lei não tem necessariamente muito de "vertical", legal ou justo. O "sistema" é feito por humanos e terá sempre o seu Q de parcial.

    Essa teoria está cheia de buracos. :P

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  2. Aleluia, alguém que me deixa transformar uma hipótese teórica num exercício de dialética. :D

    Pois, primo não sei se é uma definição legal de familiar em algum lado do mundo. É só lembrar que nos meios rurais (tipo Trás-os-Montes) são todos "primos" LOL

    Mas vamos substituir primo por filho ou pai. Ora bem, nesse caso referes-te a uma lei recente que passou a exigir a declaração de transferências de quantias superiores a x"" (não sei o valor de cor) mesmo entre familiares e essa lei existe por uma razão simples. Tens 1000€ que te passaram para o bolso debaixo da mesa, qual a forma mais fácil de lavares esse dinheiro? Fingir que o deste ao familiar e usá-lo através da conta dele.

    Ora na teoria de que te falo, também teria de haver um tecto máximo até ao qual o estado não conta o dinheiro como rendimento (por exemplo um salário mínimo), todos os outros valores são rendimentos (são sempre se pensares bem).

    Mas nem seria preciso tu dares dinheiro ao teu primo porque com uma evasão fiscal muito menor (graças à simplificação da tributação e ao fim do segredo bancário), o estado teria dinheiro para pagar 100% do último ordenado como subsídio de desemprego.

    Quanto à questão do colar falhas-te o essencial do paradigma ético que se coloca. É errado ter amantes, ponto final. Ninguém é obrigado a casar-se ou a ter uma relação de compromisso, logo se não quer ser fiel tem boa escolha... ou seja, estás a defender o segredo como escape para a falta de verticalidade de alguém.

    Mas centrando-me na tua hipótese, hás de convir que a tua cunhada é uma excepção à regra e não a regra em si. Ou seja, claro que há funcionários públicos pouco rectos mas será uma ovelha negra que põe em causa a subsistência de um rebanho? Ou seja, não aplicar um sistema mais justo porque sabemos que irá ter falhas? Todos os sistemas têm falhas, é uma questão de encontrar um que tenha menos que o actual...

    E claro quem faz as leis não é necessariamente nem ético, nem inteligente, nem solidário, mas também não é necessariamente o contrário. Não te esqueças que és "tu" que votas em quem faz as leis (aproveito a deixa para te pedir como teu compatriota para não deixares de votar este ano).

    Mas para mim, a principal razão para existirem leis mal feitas ou tão esburacadas, prende-se exactamente com a falta de estudo e a falta de diálogo como este que estamos a ter.

    Ou seja, uma lei não se constrói num post rápido de um blog (o meu objectivo era pôr esta ideia à prova... e resultou), mas também não se deve construir dentro de quatro paredes e sem a opinião dos cidadãos.

    Mas sem ideias e discussão nenhuma sociedade evolui, isso é que é mais que certo ;)

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  3. Nem sei por onde começar.
    Então achas que nem todos os funcionários públicos ou "fazedores de leis" (é uma redundância, eu sei) são uns diabos vermelhos. Mas toda essa teoria se baseia no princípio de que todos os trabalhadores são desonestos e não declaram os seus vencimentos, logo temos de ir verificar as contas todas, porque senão não nos dizem a verdade.
    Se tratares um ser humano como uma criança durante 50 anos, ele vai ser uma criança durante esses 50 anos.

    E sim, concordo plenamente que quem se compromete num casamento a isso não é obrigado e não tem nada que enganar os outros, mas quem somos nós para julgar o que é correcto ou não?! Simplesmente não me parece que me diga respeito, a mim ou a qualquer funcionário público que de forma pouco clara tenha acesso a informação privada.
    Em relação à cunhada não ser a regra, discordo completamente.
    A uns é dado mais "poder" que a outros e a regra quando isso acontece é a mente ficar turva. Exp: - Quantos polícias criminosos há, se assumirmos o crime como acto criminoso perante a lei, e não falando de cadastros? Serão assim tão poucos que se possa chamar minoria.

    A propósito do primo, e se for um amigo, não lhe posso dar dinheiro para o ajudar? Isso quer dizer que estamos a fugir ao fisco?
    Portanto, voltamos ao princípio de que somos todos desonestos (menos os funcionários públicos!).

    Esta obsessão por controlar tudo cresce com a sociedade e a par e passo acaba-se com tudo o que é natural e espontâneo. Acaba-se com a vida e passamos a ser robots que servem para alimentar a dita "economia global". Alimentamos a maquina e acabamos nós próprios por não existir porque Eles vêem tudo e temos de fazer tudo com a aprovação d'Eles.

    Tem de haver limite aos limites. Senão não é vida e a taxa de suicídio aumenta. Alguma liberdade é saudável e faz crescer.
    Não é por se sentir controlado que o cidadão deve contribuir, mas, por compreender que ao contribuir se ajuda a si mesmo a viver melhor.

    O que faz falta é educação e não controlo.
    À força dói mais! LOL

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