o rendimento mínimo



Sinceramente, não sou muito dado a conferir excessiva atenção às demagogias que a direita vai veiculando através dos media, de forma a defender o seu belo sistema (bela merda na minha opinião), mais ou menos liberal mas sempre socialmente irresponsável e às vezes até mesmo malicioso.

Infelizmente, com a subida do CDS-PP nas eleições legislativas, o eterno maquinista Paulo Portas já fumegava com outra potência e decidiu durante as autárquicas, fazer um ataque sem reservas ao Rendimento Social de Inserção (rendimento mínimo), apoiado num artigo do isento e sério Correio da Manhã, que noticiava uma estimativa de que as fraudes do RSI ascendessem a 118 milhões € (isto quando a fonte mais fidedigna, a Segurança Social, fala em cerca de 14,7 milhões em ano e meio). Mais, diz portas que se fosse governo tirava o dinheiro aos fraudulentos (descobrindo quem são através do método do "um-dó-li-tá") e usá-lo-ia para aumentar as reformas dos idosos (os únicos "pobres" que votam nele), o que significaria um aumento de 10€ em cada reforma!

Como disse ao inicio, não tenho hábito de perder tempo com palhaçadas deste nível mas vejo cada vez mais pessoas que pensei de bom senso ou pelo menos avessas às ideias de extrema-direita, muito revoltadas com não só as fraudes mas com o subsídio em si. Os argumentos de Portas ficam na orelha, principalmente aquele que refere que os beneficiários são malvados e preguiçosos, que vivem às custas dos portugueses que trabalham...

Claro, que se retira premeditadamente da equação, o facto da média deste subsídio ser de 90€. Ou então o senhor Portas, com o seu apartamento "colorástico", com a sua colecção de invejável de livros (digo-o como elogio) e gosto careiro de almoçar sushi, afirma ser possível sobreviver desafogadamente e ociosamente um mês com este dinheiro (aos preços do restaurante que ele frequenta ou pede take-out, dava para 5 almoços).

Mas voltando ao cerne da questão, gostaria de lhe perguntar a ele e aos portugueses que estão obcecados com as supostas fraudes do RSI, se já fez as contas para saber quanto aumento de reformas é que seria possível pagar, com os entre 10 e 14 MIL MILHÕES DE EUROS nos quais estão estimados os valores da fuga ao fisco, todos os anos?!

Como Guterres dizia "é só fazer as contas"...

Para ajudar a perceber melhor a dimensão que separa estes dois factores (ambos negativos e nisso concordo) fiz o gráfico acima deste post para ilustrar visualmente a diferença das suas dimensões e consequentemente da sua importância. E até fui simpático, porque usei o valor hiperbólico de 180 milhões € para o RSI (acredito mais nos valores oficiais porque sei na pele, o difícil que é ter apoio da Seg. Social) e comparei com o valor mais baixo da fuga ao fisco. Se tivesse usado o valor oficial das fraudes ao RSI, mesmo mantendo os 100 mil milhões €, a barra do RSI seria um risco sem visibilidade.

Parece-me uma prova das prioridades trocadas da direita e infelizmente de muitos meus compatriotas que foram hipnotizados pelo canto da sereia, sem pensar para lá dos sound-bites. É claro, que para a direita é muito mais fácil atacar a parte mais fraca, os pobres desgraçados que têm de recorrer ao RSI, não têm geniais contabilistas, offshores à escolha e advogados maravilha para lhes garantir as falcatruas e assim o contribuinte português fica todo contente que a bandeira azul com o falo amarelo (a laranja está com bicho), lá lhes conservou melhor o dinheiro dos suados impostos.

Mas nada que espante quem vê o neo-liberalismo por aquilo que é, um feudalismo do capital em que quem tem dinheiro pode, quer e manda e onde o estado serve para controlar e reprimir as classes baixas privadas da recompensa justa da sua produção.

Penso que qualquer pessoa com bom senso condena qualquer tipo de fraude, mas fazer deste caso uma prioridade quando temos milhares de milhões de euros que não são cobrados em impostos, é no mínimo hipocrisia e no máximo crueldade, tendo em conta a quantia irrisória que poderá estar a ser desviada por cada "criminoso" e a situação social dos mesmos.

Só consigo encontrar explicação para esta situação desproporcionada, se for extremamente negativo e culpar a inveja profunda do português em relação ao que o próximo tem (mesmo que sejam tostões) e o ignorar da fuga ao fisco por ânsia de fugir também ao pagamento dos impostos. Se for este o caso está explicada o nosso fosso em relação aos resultados económicos e sociais de países nórdicos, onde o pagamento dos impostos é considerado uma obrigação e a fuga é muito mal vista (aliás toda a corrupção e nepotismo), para um país onde o chico-esperto é o herói da tasca ou do café e exemplo de superior inteligência (esperteza).

Acho que temos de aprender a ser mais solidários, éticos, cívicos, cumpridores e aprender que o dinheiro e os bens materiais são um meio e não um fim e como tal de nada servem com mal-estar social e um estado sem recursos.

Fontes:
Agência Financeira (IOL)
Jornal de Negócios

PS: Peço desculpa pelo testamento mas precisava de deitar tudo para fora...

1 comentário:

  1. Bom texto. O perigoso argumento do CDS não é contestado por ninguém e são necessários comentários destes, fundamentados.

    Excepto a questão "rendimento máximo garantido" do Gato Fedorento, está tudo com receio - ou sem ideias - o que é grave. A direita "moderna", que quer fazer milagres com o "aperto de cinto" à classe média, aprova os nórdicos mas esquece-se que boa parte contribui com 40% do que ganha para o bem público.

    Quando é que o profissional liberal Paulo Portas começa a dizer o que realmente pensa sobre o salário mínimo? Sim, que "deveria ser abolido".

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